quarta-feira, setembro 20, 2006

Amores revisitados...Parte II

Era uma segunda-feira solarenga de Outubro, esperei ansiosamente pelas 15h00 e lá fui apanhar o metro a Entrecampos com destino ao Rossio. Dirigi-me à entrada dos actores do Teatro D. Maria e disse que o Sr Filipe estava a aguardar por mim. Um senhor com ar boçal e barrigudo faz um telefonema e em menos de 5 minutos aparece o Filipe, com aquele, maravilhoso sorriso e acena-me com a mão.
Dirigi-me a ele completamente deslumbrado com toda a situação, descemos umas escadas, atravessamos uns corredores e entramos num bar, que eu creio não ser de acesso ao público geral, em que estavam actores e actrizes bem conhecidos do nosso teatro. Os comentários fizeram-se sentir quando entrámos: olhares indiscretos acompanhados de sussurros e segredos. Houve até quem o chamou à parte e percebi que lhe fizeram a pergunta de quem seria eu, uma vez que ouvi a resposta “É um amigo…”, e um olhar rasgado de um sorriso deixou transparecer cumplicidade na aceitação da resposta.
Bebemos um café e falámos durante meia hora, sobre as nossas vidas, os nossos interesses, filmes enfim tudo mas nada em geral. Fomos sistematicamente interrompidos por pessoas que o iam cumprimentar deliberadamente para me poderem observar bem.
Assentámos que o Filipe me iria ligar na quarta-feira para combinarmos uma saída no fim-de-semana. Despedimo-nos e aquele sorriso começava a ser cada vez mais bonito e começou a ficar cada vez mais preso aos meus pensamentos.
Quarta-feira, tal como havia combinado, telefonou-me de uma cabine pública para sairmos sexta-feira. Fiquei radiante, mas ao mesmo tempo irritado porque não seria antes na quinta-feira. Mas que interessava era sairmos. Combinámos, então, encontrarmo-nos na Brasileira.
Assim foi...
O início da noite começava na Brasileira. Era o início da feira das vaidades, uma verdadeira mostra de alta-costura e as tendências da moda. Eu divertia-me de ver aquelas tontas a desfilarem para cima e para baixo na esperança de chamar a atenção de quem procurava o prazer de beber um café, ou simplesmente procurava companhia para passar a noite. Pode-se dizer, mesmo, que o engate da noite começava ali.
Os meus olhos percorriam a Rua Garret na esperança de encontrar o sorriso que me acompanhava antes de adormecer. Eis que por detrás de um artista de rua que tocava trompete aparece ele.
O Filipe bebeu um café e conversamos sobre amores passados. Fiquei a saber que tinha tido um namorado que tinha sido assassinado, após terem acabado, decorrente de um “engate mal feito”…uma história tétrica. O tempo foi passando e dirigimo-nos ao Frágil. Como sempre estava a abarrotar pelas costuras. Como era tradição toda a gente que entrasse no Frágil tinha que passar sempre pelo lado esquerdo – oposto à pista – para ver quem estava e com quem estava…O cumprimentos habituais, muitos deles de gente sem interesse nenhum, mas nestas lides há que manter uma determinada pose e ser-se muito fingido e fútil…Encostados às paredes e a uma pá de uma hélice que aí havia, homens segredavam aos ouvidos uns dos outros tocando os lábios nas orelhas dos parceiros, outros iam bebendo desmedidamente, as mulheres com cabelos muito artísticos de todas as cores e feitios.
Fomos para a pista. Vivia-se moda da dança da almôndega. Moda, essa, que o Manuel Reis – dono do Frágil – tinha proibido, e quem o fizesse era convidado a sair. A almôndega era um comboio de gente cujos corpos se colavam e as mãos percorriam o que quisesse. Não interessava se era homem ou mulher, o que interessava era que todos dançassem colados uns aos outros ao mesmo ritmo. Não entrámos na almôndega, ficamos encostados a ver a cena. Ocasionalmente dançávamos quando a musica era mais apetecível. Recordo com grande prazer desse tempo os Stereo MC’s com o “Connected”. Não conversámos muito, bebi água e ele um cerveja. Começou a queixar-se que estava cansado e que tinha de se ir deitar e perguntou-me se eu queria que ele me deixasse nalgum lado.
Foi a minha primeira grande decepção. Que grande tampa!! Como não queria que ele pensasse que eu iria ficar no engate, pedi-lhe que me deixasse no Cais do Sodré, para apanhar o barco para ir para casa. Assim foi.
A minha primeira noite com o Filipe terminava às duas da manha. Eu não queria acreditar. Durante tanto tempo, seria a primeira vez que ia para casa tão cedo.
Foram por agua abaixo, fantasias, desejos e ilusões de uma noite. “Que se lixe!” pensei, “pelo menos saí uma vez com ele”, tentando assim conformar-me com aquele desfecho de noite.
As esperanças reacenderam-se quando nos despedimos e ele perguntou: ”posso ligar-te durante a semana?”….

10 comentários:

Manuel disse...

O Baião!?! Nossa senhora! Nessa altura ele estava no "Maldita Cocaina" no Politeama!

Luís disse...

Ó pá! Tu vê lá se contas o próximo capítulo bem depressa. Estou para aqui a morrer de curiosidade :)

Manuel disse...

Serrano:
Acredito que seja estritamente jornalistico...lololololol

Luis:
Tenho que estar inspirado...senão a escrita começa a ser entediante - está a ser bom recordar algumas coisas...
Wait...

Paulo disse...

Um vencedor pode ter experimentado reveses momentâneos. mas, de forma alguma, entrega as «armas». Há certas coisas, queimporta também manter uma atitude confiante.
Nunca um vencedor deve dizer: "tornei-me naquilo que os teólogos chamam um consuetudinário, um inveterado".

Obrigado pela visita.

"Fumar prejudica gravemente a sua saúde e a dos que o rodeiam"...então, FUME!!!!!Riss

Paulo

Anónimo disse...

é pah não sou do tempo das almondegas... buaaaaaa isto foi em que ano jovem? Maldita cocaína? foi há uns 10 anos.

Anónimo disse...

PS: Já consigo comentar.

Anónimo disse...

Concordo contigo Manuel quando dizes: "está a ser bom recordar algumas coisas" Recordar é viver e quando nos sentamos a escrever sobre as nossas memórias, sobre o nosso passado, o amor ou simplesmente as experiências que nos tocam mais especialmente, devemos deixas os pensamentos escorrerem... a mente resaturar e saborear com doçura cada instante momento. Escreves bem! Continua!

O que acho mais interessante aqui não é estares a falar de uma história que se passou com o A ou B que era artista ou escritor... é antes falares daquilo que sentiste, daquilo que foi o que te fez descobrir tanta coisa e decerto, para contares e lembrares agora, te fez crescer tanto também :)

Um abraço

Manuel disse...

Serrano:
Nos teus contos não começas pelo fim, certo!?!
Espera...sê virtuoso!

Pedro Eleutério disse...

olá,

gostei de ler estes teus dois ultimos posts. Dei com o teu blog por intermédio de outro blog. Confesso que achei a tua apresentação inicial um pouco bruta. Ser gay ou nao ser... o que isso interessa. Espero pela continuação da história.

um abraço

Manuel disse...

Pedro Eleutério:
De facto a apresentação está um pouco, não diria bruta, mas sim nua e crua. Por um lado não quero ferir susceptibilidades para quem, casualmente der com a página e se surprenda com a leitura, por outro economiza tempo para quem não está interessado em determinadas temáticas ou histórias de vida "marginais"...
Obrigado pela visita e pelo coment.

Um abraço.